domingo, 1 de maio de 2011

A sobrevivência do MST
 
 

Ontem fui entrevistado por Daniel Cassol, do IG, sobre a retomada das ocupações do MST.  Continuo insistindo que o MST vive seu ocaso e mesmo o aumento de ocupações neste abril vermelho (70 ocupações) estão abaixo dos anos de ouro. Foi um brutal esforço dos dirigentes para demonstrar força neste início de gestão Dilma.
Os dados populacionais e de renda falam mais alto. De acordo com o censo, a população rural perdeu 2 milhões de pessoas entre 2000 e 2010 e, agora, representa 15,6% da população total do país (29,8 milhões de um total de 190,8 milhões).
O ritmo de migração, em virtude dos programas sociais do governo federal, se reduziu aceleradamente. Enfim, a base social do MST diminui e os que ficam no campo, não se arriscarão a enfrentar um batalhão de choque se podem sobreviver por outras fontes. 
A matéria do IG sobre o MST


MST não dá trégua a Dilma e faz 70 invasões no "Abril Vermelho"
 
 
 
No 1º ano de Lula, movimento fez 23 invasões. Mas, diferente de Lula, Dilma encontra um MST enfraquecido

Daniel Cassol, iG Rio Grande do Sul

 
 
 
 
 
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) terminou o “Abril Vermelho” de 2011, o primeiro sob o governo de Dilma Rousseff (PT), com um número de invasões de terra bem maior do que as realizadas no primeiro ano de governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A retomada das invasões, contudo, não esconde uma das principais características deste "Abril Vermelho": a redução do número de famílias acampadas. Segundo o balanço divulgado pelo próprio movimento, o “Abril Vermelho” deste ano registrou 70 invasões de terra em 10 Estados. A comparação com o levantamento realizado anualmente pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), tradicional aliada do movimento, mostra que o MST não concedeu “trégua” à presidenta em seu primeiro ano de governo, como fez com Lula em 2003. Naquele ano, o movimento comandou 23 invasões.

Ano 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Abril 23 92 47 31 66 64 33 74 70
(Comissão Pastoral da Terra)

Com base nos relatórios anuais da CPT, o iG analisou as mobilizações do MST realizadas no mês de abril, quando o movimento lembra a morte de 19 sem terra no massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará, em 1996. A comparação começou em 2003, primeiro ano do governo Lula, até 2011, no primeiro ano do governo Dilma.
Em 2004, após um período de “trégua” a Lula, o MST realizou 92 invasões de propriedades rurais em 18 Estados durante o “Abril Vermelho”, com a participação de quase 20 mil famílias. O número foi caindo a cada ano, chegando a 33 ações em abril de 2009, quando pouco mais de cinco mil famílias participaram das mobilizações.
Do ano passado para cá, porém, o ritmo de invasões de terra durante a jornada de abril mostrou uma recuperação. Foram 74 em 2010, com nove mil famílias, e alcançaram 70 neste ano, segundo informações do MST. Não existe uma informação precisa sobre o número de famílias envolvidas em 2011.
Para a integrante da coordenação nacional da CPT, Isolete Wichinieski, ainda não é possível falar em retomada das ações do MST, mas as 70 invasões anunciadas pelo movimento indicam que 2011 vai superar 2010, quando os movimentos rurais realizaram apenas 180 invasões em todo o período, o menor número da década. “Não sei se há uma retomada das mobilizações, mas há um investimento maior nas ocupações. Os dados do ano passado revelaram uma diminuição das ocupações. Mas todo início de governo tem uma pressão maior para que as pautas dos movimentos sociais sejam incluídas”, avalia Isolete.
Famílias
Apesar de uma aparente retomada das invasões de terra registradas neste “Abril Vermelho”, o MST, assim como outros movimentos de luta pela terra, enfrenta a redução do número de famílias dispostas a viver em acampamentos à espera de um assentamento. Estimativas apontam que o número de famílias acampadas, que esteve entre 150 mil e 200 mil no início do governo Lula, caiu para 75 mil atualmente.
As dificuldades de mobilização estão expressas no número de invasões. Nos últimos anos, o auge das invasões no Brasil foi registrado no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Em todo o ano de 1998, o MST e os demais movimentos realizaram o recorde de 599 invasões. No ano seguinte, foram 593.
Durante o governo Lula, os movimentos sociais conseguiram fazer 496 invasões de terra em 2004 e 437 em 2005, mas depois o número caiu drasticamente, chegando a 180 no ano passado.
Isolete Wichinieski, da CPT, acredita que o MST venha conseguindo manter o mesmo número de famílias acampadas, após a queda brusca. O problema estaria na adesão de novas famílias, principalmente nas periferias urbanas, beneficiadas pelos programas do governo federal.
“Houve uma diminuição no número de novos assentamentos, mas o MST continuou mantendo o mesmo número de famílias acampadas que tinha antes. O que não tem são novas famílias. Hoje é mais difícil mobilizar as comunidades urbanas. Há o aumento de renda, a diminuição do desemprego, melhores oportunidades e programas como o Bolsa Família. Além disso, como está mais difícil assentar famílias, e muitas delas chegam a ficar de sete a oito anos acampadas, isso repercute no número de famílias envolvidas na luta pela terra”, explica.
Sociólogo vê tendência ao esvaziamento
As ações do “Abril Vermelho” representam uma demonstração de forças do MST antes da negociação dos recursos do Plano Safra, que ocorrem anualmente de maio a junho. Em relação a novas desapropriações de terra, no entanto, pouco conseguem influenciar. A avaliação é do sociólogo Rudá Ricci, pesquisador das questões relacionadas aos movimentos sociais. Ele reforça que a chegada do grosso da população à classe média interfere na tradicional base social do MST, movimento que tende ao esvaziamento e poderia se tornar “residual” nos próximos anos.
“O MST vive uma situação difícil e contraditória. Difícil, porque sua base social, que é a pobreza e a miséria rurais, vêm se extinguindo, via Bolsa Família, aposentadorias e pleno emprego nas periferias. Isso retira o apelo da luta pela terra. Contradição, porque o MST vive muito do repasse de verbas públicas, como as centrais sindicais. Pode até fazer pressão, mas é uma situação delicada”, diz o sociólogo.
Autor de um livro que analisa as relações do “lulismo” com os movimentos sociais, Rudá Ricci acredita que a política de conciliação de interesses desencadeada por Lula não dá espaço para a execução da reforma agrária. De um lado, as políticas sociais retiraram milhões de brasileiros da miséria e o MST perdeu sua base social. De outro, a aliança com o setor empresarial, que é proprietários de terra, inviabilizaria uma política de reforma agrária.
“Não há espaço para reforma agrária nesse modelo. E a Dilma não está desmontando esse modelo. Há um pacto no país. O lulismo é uma conciliação de interesses, e não uma plataforma de esquerda”, destaca o sociólogo. “No governo Dilma, não vai ter reforma agrária, pode ter certeza absoluta”, completa.
Para Ruda Ricci, a tendência é que o MST se torne um movimento “residual” nos próximos cinco anos, muito em função de uma estratégia de esvaziamento executada pelo governo federal. “O governo Lula não teve nenhuma proximidade com o MST, nem a Dilma. Não chega a ser um combate ao movimento, mas um esvaziamento”, analisa.
Em entrevista ao iG, a integrante da direção nacional do MST, Marina dos Santos, afasta a relação direta entre o aumento da renda e a diminuição do número de sem terra. “Não podemos ser economicistas e fazer uma relação direta entre esses fatores e o número de famílias acampadas. Claro que esses fatores têm influência, mas há outros elementos. O mais importante é a lentidão da reforma agrária, que deixa as famílias sem motivação para acampar”, rebate.
Questionada sobre sua avaliação dos oito anos de Lula, Marina respondeu: "No primeiro ano do governo Lula estava em construção o Plano Nacional de Reforma Agrária, que não foi cumprido. O plano já existe e cabe ao governo executar, mas a reforma agrária está emperrada. Nos oito anos do governo Lula, a reforma agrária não foi prioridade. Infelizmente, o governo colocou em primeiro plano o agronegócio".
Ela diz esperar que, sob Dilma, isso mude: "O governo Dilma tem condições melhores de avançar na reforma agrária. As forças sociais da classe trabalhadora tiveram um peso grande na eleição de Dilma e na base social que sustenta as medidas populares do governo. Se essas forças sociais mantiverem um grau de unidade e fizerem lutas sociais, vamos conseguir avançar em várias áreas importantes".

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